Realizar

"Não há comparação entre o que se perde por fracassar e o que se perde por não tentar" (Francis Bacon)

terça-feira, 10 de agosto de 2010

É a aguarela uma arte menor?


Não é a técnica que se utiliza que deve importar, mas sim a forma e os conteúdos com que construímos a "nossa realidade pictórica"  partindo das técnicas mais adequadas para os fins que se tem em vista.
É nos resultados práticos, no conteúdo final, que a obra conseguir expressar, que reside a sua “grandeza”  tendo sempre este adjectivo, em arte, contornos muito controversos que nos podem transportar rapidamente para grandes discussões  do foro filosófico.
Se eu pretendo fazer um retrato hiper-realista com todos os pormenores  interpretados de um modo quase fotográfico, dificilmente a aguarela poderá ser uma boa escolha; é o espaço privilegiado do óleo , que consegue pelas suas características plásticas, nuances infinitas com excelentes possibilidades de um perfeito controle sob o ponto de vista da execução técnica, com o acrílico também se conseguem excelentes resultados, possuindo no entanto, características técnicas mais difíceis de dominar,  mas se pelo contrário, o que se pretender  for  um retrato mais interpretativo, mais criativo e informal sob o ponto de vista artístico, dando espaço de alguma forma,  à surpreendente espontaneidade das fusões tonais interessantes, que vulgarmente  acontecem quando o elemento água é introduzido generosamente na técnica utilizada como na aguarela, então, nesse caso, a aguarela pode ser o meio mais indicado para atingir esse fim, dependendo da necessidade expressiva da obra, e do gosto do artista.
A aguarela é, ao contrário do que muita gente ainda pensa, uma das técnicas mais difíceis, senão mesmo a de maior exigência técnica para uma perfeita execução. A aguarela só pode ser considerada de fácil manipulação, sob o ponto de vista do comportamento mecânico da sua plasticidade estrutural, que é constituída quase 100% por água, o que a torna fácil de manipular sob o ponto de vista mecânico, mas que exige uma antecipada programação de todos os passos a dar em todas as fases da execução da obra, obrigando-nos a uma reflexão prévia sobre os diversos pormenores a ter em conta, como o tipo de papel adequado, não só a gramagem como a sua composição e sistema de prensagem, frio/quente, grão fino grão grosso, etc. uma prévia definição do jogo de cores e respectivas diluições, e calcular com relativa precisão os diálogos tonais que se irão desenrolar, com o branco do papel a servir de principal interlocutor desses diálogos.
A exigência desta técnica de pintura reside sobretudo na fluidez e precisão dos gestos, e na impossibilidade de “mentir” porque qualquer erro de monta, é impossível de corrigir sem se notar.
No meu entender, não há artes menores ou maiores, há arte, e na arte, todas as técnicas têm à partida as mesmas hipóteses de construção qualitativa de boas ou más obras. A qualidade das obras de arte reside no que elas nos conseguem expressar, e não nos materiais e técnicas utilizados.
Um simples desenho a lápis pode ser uma obra de arte muito mais rica sob o ponto de vista artístico e técnico do que uma enorme e muito elaborada tela a óleo. O desenho neste caso poderia ser considerado uma arte menor?   É evidente que não! Toda a obra deve falar por si, transmitindo a sua própria essência.